Provavelmente você já ouviu falar de risco fiscal, especialmente relacionado com algumas crises que marcaram a nossa história como país, economia e mercado.

Nos anos 1980/90, vivemos uma série delas por aqui, que culminaram na bagunça que foi o período da hiperinflação – problema resolvido pelo famoso Plano Real.

Teve também aquela crise que deu a maior dor de cabeça entre 2014 e 2016: que derrubou o PIB, elevou os juros ao infinito e além junto com a inflação, e bagunçou todo o mercado – e os nossos investimentos.

Ainda não está lembrado, muito longe na memória? Então vamos lá! Se você viu nossos conteúdos por aqui, você ouviu falar que a situação fiscal do Brasil passou por bastante volatilidade nos últimos anos.

Qual é a situação fiscal do Brasil?

Ela [situação fiscal] estava caminhando em uma boa direção antes da pandemia. Aí veio a pandemia, e com ela maiores gastos para combater os efeitos na economia e da população; a situação piorou bastante.

No pós pandemia, e para surpresa de muitos, as contas públicas melhoraram de novo com a volta da atividade e uma ajudinha da inflação. Mas só para voltar de novo a assombrar os mercados recentemente! Pois é, parece que convivemos com esse tal de risco fiscal por aqui, desde que o Brasil é o Brasil.

Mas, mesmo sabendo que ele está conosco há um tempão, a ideia de risco fiscal continua meio intangível, né? Ou seja, a gente não consegue dizer: é isso aqui! Como a gente pode fazer, por exemplo, ao analisar o resultado de lucros de uma empresa, ou até entender a nossa aversão ou apetite ao risco como investidor usando testes de suitability.

O risco fiscal é…um negócio que paira por aí, e impacta muito nossos investimentos!

O que é e como funciona a dívida pública?

Dívida pública nada mais é do que a quantidade de dinheiro que o governo tá devendo na praça. Pois é, pessoas comuns não são as únicas que pegam dinheiro emprestado. Como já mencionamos, o governo brasileiro precisa se financiar para manter os bens e serviços públicos funcionando: saúde, educação, infraestrutura e tudo mais.

Para isso, existem os impostos, a emissão de moeda ou a opção de pegar um dinheirinho emprestado, que é o que gera a dívida pública. O ideal é buscar um equilíbrio entre esses três movimentos.

Isso acontece não só no Brasil, mas em todos os países do mundo, até os mais ricos, que inclusive costumam ter dívidas bem maiores que a nossa.

E sabe de quem o governo pega dinheiro emprestado? De todo mundo! Eu, você, fundos de investimento domésticos, fundos estrangeiros, bancos…

Tudo por meio do Tesouro Direto, que abarca muitos dos investimentos de renda fixa que andam sendo bastante recomendados ultimamente.

Mas, calma que eu já volto pra ele.

Quanto custa a dívida pública?

Primeiro, vamos entender quanto custa manter essa dívida. Esse custo está muito atrelado à nossa taxa básica de juros, a Selic, já que o governo deve pagar juros aos seus credores, como qualquer devedor.

Como a taxa Selic é a nossa taxa básica de juros, ela também corresponde ao custo da dívida do governo. E é assim em todo o mundo: nos Estados Unidos, por exemplo, a dívida pública é atrelada em parte à taxa básica de juros determinada pelo Banco Central – os Fed Funds. Quanto mais baixa a taxa, mais barata a dívida.

Mas sabemos que a taxa só pode ser baixa, se a inflação estiver controlada.

Voltando à dívida, além da taxa Selic (a qual é atrelada à parte mais curta da dívida do governo), outra importante parte da dívida do governo é atrelada a taxas de prazo mais longo – essas, determinadas por movimentos de mercado, ou seja, investidores.

E é aí que entra a percepção de risco fiscal – o mesmo amigo que impacta bastante nossa taxa de câmbio!

O que é o risco fiscal?

Uma maneira prática (e simplificada, claro) de entender o risco fiscal é pensar em um orçamento familiar. Se uma família gasta mais do que ganha ou já tem de renda, ela pode pedir um empréstimo em uma instituição financeira; ou seja, se endividar.

Comprar com o cartão de crédito parcelado, por exemplo, é uma maneira de adquirir bens e serviços que não necessariamente teríamos o dinheiro para comprar “de uma vez só”. E para fazer isso, pegamos emprestado do banco, via cartão de crédito.

Para o governo, é quase a mesma coisa – o orçamento da família, no caso, são as contas públicas. Se o governo gasta mais com bens e serviços do que ele arrecada com tributos (que eu, você e todo mundo contribui quando pagamos nossos impostos e consumimos) ele faz o que? Se endivida, assim como uma família.

Mas aí que está o pulo do gato: o governo pode se endividar muito mais do que uma família. Isso acontece, porque ele pode emitir dívida soberana, e eu você e todo mundo que compra títulos do Tesouro Nacional está financiando o governo.

Dessa forma, podemos dizer que o risco fiscal é o risco envolvido na transação de empréstimo de investidores ao governo. Ou seja, os agentes de mercado acham que o governo brasileiro é um bom pagador? O risco é menor. Do contrário, o risco é maior.

Assim, quanto mais o governo gasta além do que arrecada e se endivida, maior a percepção de risco. De quem? Dos agentes de mercado como um todo: eu, você, grandes investidores institucionais, gringos.  E quanto maior o risco, mais descontados os ativos brasileiros: tipo nossa moeda, nossas ações, ou os próprios títulos do governo.

Imagina você emprestar dinheiro para um amigo que você não sabe se vai te pagar? Você irá cobrar mais caro dele. Ou seja, você já precifica no quanto de juros cobrará do seu amigo o risco de ele não te pagar. “Quer emprestado, mas já está com dívidas para todo canto? Ok, aqui estão meus juros altos”. Simples assim.

Em resumo, o risco fiscal engloba todo o risco que os agentes de mercado precificam para emprestar dinheiro ao Brasil.

A esse risco de emprestar ao governo, damos o nome de risco soberano.

E esse risco soberano não só afeta só títulos do governo, mas de qualquer ativo brasileiro – como ações, nossa moeda, títulos de empresas, etc. Afinal, todos estão no Brasil e tem esse risco inflacionário, não é mesmo?

O que acontece quando o governo emite moeda demais?

Seguindo com algumas outras diferenças entre o seu orçamento e o do governo, temos que lembrar que, além de receitas com tributos e dívida, o governo também pode emitir moeda para pagar por bens e serviços que presta para a sociedade. Aquele famoso “imprimir dinheiro”.

Então fechado. Só imprimir mais dinheiro, não tem essa precificação toda de juros, e podemos ir pra festa. Infelizmente, não é assim que funciona. Isso porque a teoria econômica e a história nos ensinam que quanto mais dinheiro em circulação, menor o valor dele. Trata-se de uma questão de oferta e demanda.

Se todos estão procurando a mesma coisa, essa coisa fica mais cara. Então, se tem muito dinheiro na praça, os comerciantes vão aumentar os preços; afinal, por que eles cobrariam menos, se soubessem que todo mundo tem dinheiro de sobra, quer o produto, e pode pagar mais? Na prática, a grande quantidade de dinheiro disputaria os produtos existentes, e o preço de tudo iria subindo pouco a pouco – ou bastante rápido, se o processo de inflação já estiver a todo vapor.

Assim, a expectativa do valor do dinheiro no futuro também vai contar bastante no tal de risco fiscal. Voltamos ao caso do seu amigo.  Se além de estar endividado, você sabe que ele vai te pagar em uma moeda própria que ele mesmo emite. Ou seja, a credibilidade daquela moeda vem dele. Se ele sair emitindo mais e mais, rapidamente essa moeda valerá menos, e no fim você poderá comprar menos coisas com o que ele te pagou. Sabendo que seu amigo é espertinho, você cobra ainda mais caro.

Qual é o risco fiscal do Brasil?

Podemos então usar essa analogia no Brasil de hoje. Quando falamos de risco fiscal, ele engloba todo o risco que agentes de mercado precificam para emprestar dinheiro ao Brasil.

E isso vale tanto para um título público, quanto para ativos com origem no capital privado. Assim, mesmo que uma empresa que emitiu uma debênture ou que tenha capital aberto não esteja gastando mais do que pode, o risco soberano (ou seja, do governo) servirá de base para a precificação de todos os outros.

Por que? Pois como o governo emite sua própria moeda, ele pode decidir aumentar a emissão para pagar sua dívida (especialmente dado que a nossa dívida soberana hoje é quase toda em real), causando um aumento de inflação que afetará toda a economia.

Nesse caso, quando o investidor receber o retorno do seu investimento (seja do governo ou do setor privado), ele valerá muito menos.

Como o risco afeta as decisões de investimento?

Por isso, falamos tanto de todas as discussões vindas de Brasília sobre gastos, orçamento e regras fiscais. Como os agentes de mercado vivem de antecipar movimentos, e tem consciência desse imbróglio e do risco de que gastos excessivos acabem em pizza inflacionária, já antecipam tudo isso. Ou seja, colocam o preço disso tudo na conta.

Desse modo, questões como o quanto iremos gastar ano que vem, que regras fiscais vão ser criadas ou desfeitas, e para onde vai nosso nível de endividamento impactam muito os mercados. Conseguimos ver tudo isso no preço do dólar, na famosa curva de juros (que precifica os ativos de renda fixa), e na própria movimentação do Ibovespa.

Por esse motivo, fique de olhos e ouvidos abertos quando ouvir “risco fiscal”! Tem sim como se proteger de tudo isso, e tudo começa e termina entendendo seu perfil e prazo de investimentos, e diversificação!

Agora, preste atenção no que vou dizer porque pode soar estranho: esse é o menor risco do mercado brasileiro.

Mas com tanto risco, como é o menor? Justamente porque o governo é o emissor da moeda soberana, e se tudo der errado, ele pode emitir mais moeda! O mesmo não é o caso de uma empresa que emitiu dívidas ou abriu capital na bolsa, certo?

Ou seja, emprestar dinheiro pro governo, dentro do país, pode ser considerado, de maneira geral, o investimento de menor risco – com raras exceções.

Isso me traz de volta ao Tesouro Direto, que é o sistema operacional da dívida pública. Ou seja, o sistema por meio do qual investidores emprestam dinheiro ao governo. 

Como eu já disse lá no começo, comprando títulos do tesouro, você está emprestando dinheiro ao governo, em troca de receber uma certa porcentagem de juros quando resolver pegar essa grana de volta.

Mas, ao contrário do que muitos acham, o Tesouro Direto não é um ativo financeiro! Ele é apenas o sistema do Tesouro Nacional – o órgão público que faz a gestão da dívida pública.

Assim, existem alguns tipos de títulos públicos que você pode investir no Tesouro Direto. 

Tesouro Selic

O mais conhecido deles é o Tesouro Selic, cujo nome na realidade é LFT. Ele é um título atrelado à taxa de mesmo nome (a taxa Selic), e oferece liquidez diária.

Ou seja, seu retorno será o mesmo da taxa Selic. Se ela cair, o retorno oferecido por ele cai; se ela subir, ele também sobe igual. Por isso, é um título pós fixado – fixado na Selic.

Tesouro Prefixado

Já o Tesouro Prefixado, cujo nome “científico” é LTN, tem a rentabilidade definida já no momento da compra. Por isso, chamamos de pré fixado, pois ele possibilita que você saiba exatamente quanto ele vai render até a data de vencimento, se você esperar até ela!

Esse detalhe é muito importante, pois você pode vender seu título prefixado antes do vencimento. Porém, o preço irá variar de acordo com os movimentos de mercado, e a depender do momento, você pode vender por menos do que comprou.

Por isso, títulos prefixados são indicados para quando podemos coordenar o prazo de vencimento com nossos objetivos. Exemplo: quer comprar um carro em 2025? Um título prefixado que vença em 2025 pode ser uma boa opção.

E evite prazos muito longos! Afinal, você já sabe o quanto irá ter de retorno. Imagina se a inflação subir muito além disso nesse período? Você poderá ter ganhos que não superem a alta de preços.

Tesouro IPCA+

Mas para isso o Tesouro Direto também oferece o Tesouro IPCA+ (ou NTNB, no nome científico). Esse título é vinculado à inflação, além de ter uma taxa prefixada. Ou seja, é um título híbrido: parte você já sabe a rentabilidade, parte seguirá a inflação.

Exemplo: IPCA + 5% com vencimento em 2030, significa que esse título fictício renderá 5% ao ano + a inflação no período, até 2030.

Por isso, esse título é uma boa opção para quem quer conservar o poder de compra.

O Tesouro Direto também diferencia seus títulos com base nos juros recebidos, que podem ser aos poucos ao longo do período de duração do título (juros semestrais), ou de uma vez só. E isso também dependerá dos seus objetivos e perfil de investidor.

Conclusão

Bom, mas deu pra ver que os títulos do Tesouro são bem diferentes entre si. Mas, são todos títulos do governo, e tem seu retorno baseado principalmente na taxa Selic, na inflação, e na trajetória das contas públicas, além de alguns outros fatores como juros em outros países e risco global.

E se você pensa que esse papo todo de dívida pública impacta só no Tesouro, se engana.

O custo da dívida pública de longo prazo é base para todos os outros juros de longo prazo da economia, impactando o rendimento em títulos de renda fixa oferecidos por empresas e instituições financeiras, como o CDB.

Afinal, como falamos, se o governo puder emitir a própria moeda e pagar X% para se financiar em 10-20 anos, as empresas – que não podem fazer o mesmo – pagarão no mínimo esse valor. Ou seja, dali pra cima!

E, de novo, isso não acontece apenas no Brasil. No mundo todo, o custo da dívida pública no curto e no longo prazo é a base para retornos de investimentos em renda fixa de maneira geral (além de também impactar indiretamente a bolsa e outros ativos).

Por isso, questões como gastos públicos e o tamanho da dívida pública importam e muito para os nossos investimentos.

Ouça também o episódio sobre Risco Fiscal: Fala, Rico | Podcast no Spotify.

https://open.spotify.com/episode/03ty68DEDlAv7zGHTe5gN2?si=9k6jJWpqQMCakezwWvkECw

 

 

Elaborado por:

Bruna Sene, CNPI-T 1847

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