Não seja pego de calças curtas!
“Only when the tide goes out do you discover who’s been swimming naked”, Warren Buffett.
Projeções macroeconômicas são importantes para todo investidor, porque ajudam a nos prepararmos para o que vem adiante. Ou seja, não ser pego de “calças curtas”, especialmente em momentos desafiadores para os investimentos.
Isso não significa que você saberá “o dia exato em que o dólar vai cair ou subir”. Pois isso, infelizmente, será praticamente impossível. Mas quer dizer que você entenderá melhor as tendências da economia e poderá pensar em como adaptar seus investimentos (ou manter tudo como está, se for o caso), pensando no seu perfil e objetivos.
Com isso em mente, detalhamos abaixo nossas principais projeções para este ano e o próximo. Abaixo, te contamos o porquê de tudo isso, e como investir nesse cenário.
Mundo: seguimos de juros altos por mais tempo nos Estados Unidos
No cenário internacional, a pergunta que segue movendo os mercados é: “quando os juros vão começar a cair?”. A diferença dos últimos meses para cá é que essa dúvida passou a se referir, mais do que nunca, aos Estados Unidos.
Isso porque, enquanto Bancos Centrais como o do Canadá, zona do euro e Reino Unido já iniciaram o processo de afrouxamento monetário ou sinalizaram que isso deve ocorrer nos próximos meses, tudo indica que o primeiro corte de juros nos Estados Unidos ainda segue distante.
Na maior economia do mundo, a alta de preços continua “teimosa”, apesar de dados mais animadores do indicador de inflação ao consumidor (o famoso CPI) em maio.
Para ilustrar a preocupação ainda latente, a inflação medida pelo deflator do consumo pessoal (o indicador conhecido como favorito do Banco Central americano – o Fed) segue bastante acima da meta de 2,0%, quando consideramos a média dos últimos três meses – embora já seja possível ver uma leve desaceleração recente, após forte alta no início do ano.
Vale lembrar:
Juros elevados têm o objetivo de controlar a alta de preços, encarecendo o crédito, desincentivando o consumo, e desaquecendo a economia e a demanda por bens e serviços.
Além dos Estados Unidos, incertezas geopolíticas se somam aos riscos para uma reaceleração na inflação, adiando o início da queda de juros. Conflitos geopolíticos envolvendo grandes produtores de commodities, como Rússia e Ucrânia, podem voltar a pressionar importantes custos para a produção industrial global, como petróleo e fretes marítimos.
Além disso, as tensões comerciais entre China e EUA estão aumentando, o que também pode pressionar os preços de produtos importados. Afinal, quanto mais tarifas impostas ao comércio entre os dois países, maior a pressão sobre o preço de bens que utilizam importados ou mesmo equivalentes domésticos (usualmente mais caros).
Nesse cenário, esperamos que o Fed (Banco Central americano) comece a reduzir a taxa básica de juros apenas em dezembro, encerrando o ano no intervalo entre 5,00% e 5,25% ao ano.
Adiante, vemos os juros básicos no país se estabilizando em 3,5% em 2026.
Vale destacar que o início mais tardio do começo da queda de juros nos Estados Unidos não deve impedir cortes de juros em outras regiões – mas deve limitá-los. Olhando para países emergentes, como os latino-americanos, o ritmo de redução dos juros deve continuar sendo determinado por fatores domésticos, como a inflação corrente e a performance do mercado de trabalho. Entretanto, com os juros permanecendo altos por mais tempo nos Estados Unidos, a magnitude da queda pode ser limitada – especialmente por conta do impacto nas taxas de câmbio. Afinal, quanto maiores os juros nos EUA (e quanto mais tempo elevados), mais forte tende a ser o dólar, impactando a inflação mundo afora.
Enquanto isso, do outro lado do mundo, a China deve seguir lutando contra um crescimento mais fraco. O país ainda enfrenta desafios para retomar um ritmo de crescimento robusto, diante da crise que se arrasta no setor imobiliário e da baixa confiança entre consumidores, produtores e investidores.
Assim, mesmo com esforços do governo em impulsionar setores como o mercado imobiliário (a exemplo da redução das taxas de juros de hipotecas e de subsídios para compras de imóveis por governos locais), a meta de crescimento de 5,0% para esse ano segue desafiadora. Adiante, o país deve crescer menos do que o observado nos últimos anos.
Vemos o impacto dessa desaceleração, entretanto, como limitado para a economia brasileira, além de ser um ponto benéfico para a inflação global (não adicionando mais pressão sobre os preços). Entendemos que nossas exportações devem seguir fortes para o país asiático, contribuindo para a manutenção das nossas contas externas sólidas e, assim, servindo como espécie de “âncora” para nossa moeda.
Falaremos mais sobre nossa visão para a taxa de câmbio abaixo.
Enquanto isso, no Brasil
PIB vem forte no primeiro trimestre, mas incertezas crescem no horizonte
Por aqui, esperamos que a economia cresça 2,2% no ano, mas incertezas cresceram nos últimos meses.
Do lado positivo, o resultado do PIB ilustrou o forte crescimento da economia no primeiro trimestre, conforme divulgado no início de junho. Como contamos aqui em detalhes, a soma de tudo o que produzimos de bens e serviços variou perto de 1% no período entre janeiro e março de 2024 (comparado ao resultado registrado entre outubro e dezembro de 2023).
A performance positiva foi impulsionada principalmente pelo consumo das famílias e pela retomada de investimentos, e veio depois de dois trimestres em que a economia ficou praticamente estagnada.
Vale destacar o crescimento da renda das famílias como um dos principais motores do crescimento observado nos últimos meses. Para se ter uma ideia, a métrica chamada “massa de renda disponível” das famílias (grosso modo, a renda após o pagamento de impostos) cresceu nada menos do que 4,5% acima da inflação nos primeiros três meses de 2024.
A alta da renda das famílias, por sua vez, reflete uma série de fatores, dentre os quais: um mercado de trabalho aquecido (desemprego no menor patamar em quase dez anos); maiores programas de transferência de renda; e a decisão do governo de quitar o pagamento de precatórios no fim do ano passado (com famílias recebendo montantes devidos pelo governo por decisões judiciais).
Em bom português: famílias viram crescer sua renda no período, e se utilizaram desse impulso para consumir mais bens e serviços.
O ciclo de queda de juros também contribuiu tanto para o crescimento do consumo, quanto para a retomada dos investimentos. Embora o Banco Central tenha começado a reduzir a taxa Selic em 2023, os efeitos demoram a ser sentidos na economia – movimento que ficou mais evidente no início desse ano. Como ilustrado no gráfico abaixo, o primeiro trimestre viu uma melhora em fatores como inadimplência de famílias e empresas, e maiores concessões de crédito.
Dito isso, olhando para frente, esperamos que a economia perca ímpeto gradualmente, embora deva seguir em terreno positivo. O enfraquecimento esperado é explicado por uma série de fatores, dentre os quais vale destacar:
- Os impactos da tragédia climática no Rio Grande do Sul: projetamos que o desastre natural no estado reduzirá a taxa de crescimento do PIB em 0,8 p.p. no segundo trimestre de 2024 (na comparação com o segundo trimestre de 2023), e algo entre 0,2 p.p. e 0,3p.p. do crescimento anual da nossa economia.
- A redução do impulso fiscal: não esperamos uma redução de benefícios fiscais, mas a acomodação de maiores transferências tende a suavizar o consumo, além de não haver espaço para antecipações como as vistas na primeira metade do ano, como do 13° salário, ou de precatórios (pagos no fim de 2023).
- O efeito do fim da queda dos juros: diante de incertezas tanto globais quanto domésticas, entendemos que o Banco Central deve encerrar o ciclo de reduções da taxa Selic em breve – mantendo os juros básicos em patamar contracionista, ou seja, que encarece o crédito com o objetivo de controlar a alta de preços.
Assim, vemos o PIB crescendo 2,2% em 2024. Já para 2025, o crescimento deve desacelerar, com o PIB subindo 1,7%.
Inflação deve seguir comportada, mas riscos adiante exigem cautela
Como contamos em detalhes aqui, o IPCA (nosso principal índice de inflação ao consumidor) registrou alta de 0,46% em maio. Após encerrar o ano de 2023 dentro do intervalo de tolerância da meta do Banco Central, o indicador voltou a subir, após meses de queda, no acumulado em doze meses, com elevação de 3,93% até abril (frente a 3,69% em abril, 3,93% em março, e 4,63% no número fechado do ano passado).
Quer saber mais sobre a política de metas de inflação? Te contamos aqui!
O resultado de maio veio acima das expectativas da maior parte dos analistas, com a surpresa vindo principalmente nos preços mais voláteis, como passagem aérea (que avançou no mês 5,91%) e energia elétrica, que mostrou avanço devido ao reajuste anual de parte das distribuidoras, seguindo o calendário da Aneel. Além disso, a alta no mês refletiu os primeiros impactos da tragédia climática no RS, e reacendeu a luz amarela para preços no setor de serviços – que tinham acalmado nas últimas divulgações.
O impacto da tragédia recente no Rio Grande do Sul também merece destaque. A principal contribuição para a alta da inflação no RS veio, conforme esperado, dos preços de alimentos, especialmente da categoria “in natura” (frutas e legumes), além de leite e derivados, frango e produtos relacionados ao trigo (como massas e pães). Para se ter uma ideia da magnitude, enquanto a inflação de “alimentação no domicílio” foi de 0,66% no Brasil todo, a variação vista no Rio Grande do Sul foi de 3,64% – isso considerando apenas no mês de maio.
A região responde por 70% da produção de arroz do país, além de ser um dos principais produtores de soja e proteínas, incluindo frango e carne bovina. Assim, os prejuízos causados pelas chuvas devem impactar a oferta desses alimentos, elevando a inflação especialmente regional. Do ponto de vista nacional, entretanto, entendemos que o impacto deve ser mais limitado e se dissipar ao longo dos próximos meses.
Sobre os preços no setor de serviços reacendendo a luz amarela, a métrica chamada “serviços subjacentes” (que exclui preços mais voláteis, como passagens aéreas) subiu de 4,9% em abril para 5,1% em maio na média móvel dos últimos três meses até abril – se afastando da meta de 3,0% do Banco Central.
Vale destacar que a inflação de serviços é essencial para entender comportamento dos preços no geral, sinalizando tendências adiante. Isso porque eles tendem a ser menos impactados por movimentos que chamamos de “oferta” (como o clima e a redução ou aumento da oferta de determinada commodity); tendo seu movimento mais relacionado ao comportamento dos salários.
O mercado de trabalho aquecido aumenta o poder de compra das famílias ao impulsionar a demanda por bens e serviços. Portanto, o movimento pressiona a inflação – principalmente de serviços. Essa métrica vem mostrando resistência ao processo de desinflação ao longo de 2024 e está sendo observada de perto pelos economistas.
Além de preços de serviços “teimosos” e um mercado de trabalho aquecido, a recente desvalorização do real também sinaliza cautela para a inflação adiante. A moeda americana saltou de pouco mais de R$ 5,00 no início de abril para R$ 5,40 recentemente – refletindo tanto um cenário externo de dólar fortalecido (por juros altos por mais tempo) quanto o aumento da percepção de risco fiscal por aqui.
Apesar dos riscos, embora o IPCA deva terminar esse ano acima da meta do Banco Central (3,0%), não vemos a inflação acelerando para muito além do patamar de aproximadamente 4,0% no curto prazo.
Vale lembrar dos efeitos de uma taxa de juros ainda restritiva. Entendemos que o Banco Central deve parar de reduzir a nossa taxa básica de juros, diante de maiores riscos para a alta de preços tanto no cenário doméstico quanto global. Assim, a taxa Selic deve seguir em patamar restritivo pelo menos até o fim desse ano – ainda desaquecendo a economia com o objetivo de conter a alta de preços.
Nesse cenário, projetamos que o IPCA encerre 2024 em 3,7% e em 4,0% em 2025 – ambos acima da meta do Banco Central, mas dentro do intervalo de tolerância.
E o dólar, vai para onde?
As últimas semanas foram marcados por forte volatilidade do dólar. Depois de fechar o ano de 2023 abaixo de R$/US$ 4,90, a nossa taxa de câmbio chegou a alcançar a barreira de R$/US$ 5,40. Nos últimos dias, o dólar está rodando no patamar de aproximadamente R$ 5,30.
A depreciação recente da nossa moeda refletiu movimentos principalmente domésticos, dos quais destacamos a piora da percepção de risco fiscal e o cenário político no Brasil – dúvidas sobre a efetividade de medidas de elevação de receitas, preocupações crescentes com relação ao cumprimento das metas fiscais, além de ruídos políticos têm impactado a percepção de risco sobre ativos brasileiros, incluindo a nossa moeda.
Também tem impacto na nossa moeda o fato de que os juros básicos nos Estados Unidos devem seguir altos por mais tempo – esse movimento tende a fortalecer o dólar frente a outras moedas (conforme discutido acima), por atrair capital em busca de maiores retornos.
Dito isso, ainda vemos uma tendência de relativa valorização do real nos próximos meses – especialmente graças à robustez das nossas contas externas. Isso porque seguimos atraindo forte fluxo de capital estrangeiro tanto pela via comercial quanto de investimentos, impulsionados – entre outras coisas – pela forte extração mineral (petróleo e minério de ferro) e produção agrícola, e pela posição relativamente positiva quando comparado a outros emergentes mais expostos a riscos geopolíticos, como Rússia, China e Turquia.
Assim, embora o preço de grande parte do que exportamos tenha caído nos últimos meses, a quantidade exportada mantém o fluxo de dólares para cá elevado. E quanto mais dinheiro estrangeiro por aqui, mais valorizada tende a ser nossa moeda.
Projetamos a taxa de câmbio em R$/US$ 5,00 para o final de 2024, com média anual ao redor de R$/US$ 5,10, e de R$/US$ 5,15 para o final de 2025.
Mas vale destacar que essa projeção não significa que esse será o valor da taxa de câmbio ao longo de todo o ano. Pelo contrário, esperamos que o “sobe e desce do dólar” siga presente, especialmente diante do alto nível de incerteza nos cenários global e doméstico.
Selic não deve mais cair esse ano, diante de incertezas globais e domésticas
Como contamos aqui, o Copom (nosso comitê de política monetária) optou por reduzir a taxa Selic em 0,25 ponto percentual em sua reunião de 08 de maio. A decisão deu continuidade ao processo de queda de juros iniciado em agosto de 2023, levando a taxa para 10,50% ao ano.
Em um recado duro, o Comitê destacou que tanto o ambiente externo quanto o doméstico ficaram mais incertos nos últimos meses.
Lá fora, os juros devem seguir altos por mais tempo nos Estados Unidos, apesar de dados recentes terem trazido certo alívio aos cenários de inflação e mercado de trabalho.
Juros altos por mais tempo na maior economia do mundo adicionam riscos à nossa inflação, principalmente por contribuir para o fortalecimento do dólar em relação a outras moedas, especialmente as emergentes – consideradas mais arriscadas e que, portanto, passam a atrair menos capital estrangeiro diante dos altos retornos nos EUA.
Já no campo doméstico, a combinação de um mercado de trabalho forte e aumento de incertezas fiscais se traduzem em maiores riscos para o controle da inflação.
Um mercado de trabalho aquecido tende a pressionar os salários, dado o maior poder de barganha de trabalhadores. Com maiores salários, aumenta-se a demanda por bens e serviços na economia – e o movimento de alta de preços se retroalimenta.
Já a piora da percepção de risco fiscal impacta a inflação tanto por deteriorar as expectativas sobre a alta de preços no futuro, quanto por pressionar o câmbio.
Afinal, quanto mais o governo gasta, maior a expectativa de que a demanda aquecida por bens e serviços impulsionará os preços no futuro, desancorando as expectativas sobre a inflação futura.
E quanto mais esse gasto cresce além da arrecadação do governo, maior o risco “precificado” por investidores em ativos brasileiros, como a nossa moeda – desvalorizando-a, e pressionando a inflação também por esse lado.
Diante do cenário mais incerto, entendemos que o Banco Central deve encerrar o atual ciclo de queda da taxa Selic em sua reunião de junho, aos 10,50% ao ano. Isso significa que os juros devem parar de cair antes de atingirem o patamar considerado como neutro.
Ou seja, seguiremos com certo “pé no freio” na economia ao longo dos próximos meses, embora já em menor magnitude do que no último ano.
Como investir nesse cenário?
Com tantos eventos e mudanças no cenário econômico no Brasil e no mundo, entender como melhor investir o seu dinheiro e proteger o seu patrimônio é essencial.
Por isso, destacamos abaixo nossas recomendações de alocação atualizadas de acordo com o seu perfil de investidor, além de sugestões de onde investir em cada classe de ativo (como ações, renda fixa e fundos de investimento).
Vale lembrar que as recomendações sinalizadas na tabela abaixo não são as únicas possíveis, mas sim alternativas viáveis selecionadas pelos nossos especialistas para você.
Confira tudo isso em detalhes no nosso relatório “Onde Investir” – acesse aqui!
Classe | Opção de investimento | Opção de investimento2 | Mínimo da opção mais acessível |
Renda fixa pós-fixada | CRI Cyrela -04/2028 – 98% CDI* isento | Selection RF Light FIC Renda Fixa Crédito Privado LP | R$ 100,00 |
Inflação | NTN-B – ago/28 – IPCA+5,86% | CRA Marfrig 03/2034 – IPCA+ 6,65% *isento | R$ 50,00 |
Renda Fixa Prefixada | Tesouro Prefixado jan/2026 – 10,71% | R$ 100,00 | |
Renda Fixa Global | Trend High Yield Americano FIM | Trend Crédito Global FIM | R$ 100,00 |
Multimercado | Selection Multimercado FIC FIM | Kinea Atlas II | R$ 100,00 |
Renda variável Brasil | Carteira Rico11 | Selection Ações FIC Ações | R$ 100,00 |
Renda variável internacional | Wellington Us BDR Advisory Dólar FIC Ações BDR Nível 1 | M Global BDR Advisory Dólar FIC FIA BDR Nível I | R$ 500,00 |
Renda variável internacional hedgeada | Trend Bolsas Globais | Trend Bolsas Emergentes | R$ 100,00 |
Alternativos/ Fundos Imobiliários | Carteira de FIIs Rico | R$ 100,00 |
Elaborado por:
Bruna Sene, CNPI-T 1847
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