Resumo do dia: Os alfinetes de Trump e Biden e o chinês sorrindo
Mercados globais amanhecem mais animados nesta terça: nos EUA, os futuros sobem entre 0,07% e 1%, com exceção do Dow Jones, que fica praticamente no zero a zero. Na Europa, o Stoxx 600 sobe 0,24%.
A boa notícia vem da China. Com as exportações suportando a retomada chinesa, o PMI privado – um dos principais indicadores de atividade econômica – teve alta pelo quarto mês consecutivo, a 53,1 (leituras acima de 50 indicam expansão).
Nos EUA, dias de protestos e incidentes violentos aumentaram o foco ao tema de segurança pública e abusos policiais na seara eleitoral. Donald Trump procura se mostrar como o candidato mais firme no lado da segurança e caracteriza Joe Biden como “fraco”. O presidente deve viajar a Kenosha, Wisconsin ainda hoje, o que pode agravar tensões: a cidade teve dois mortos e dois feridos pelos confrontos na semana passada.
Por sua vez, Biden disse que era contra o corte de financiamento da polícia e negou ser o “cavalo de Tróia” dos progressistas, algo que o presidente americano alegou há poucos dias. Ainda, disse que o eleitorado americano conhece seu histórico e sabe que não é um “socialista radical com uma fraqueza por motineiros”. Também acusou Trump de ser “fraco” e incapaz de proteger o povo dos EUA.
No Brasil
Por aqui, o Ibovespa fechou o último pregão do mês de agosto em forte queda de 2,72%, aos 99.369 pontos, “coroando” um mês bastante volátil com queda acumulada de 3,44%.
Na agenda do dia, o destaque fica para a divulgação do PIB nacional do 2° trimestre de 2020. Além disso, o presidente Jair Bolsonaro vai promover hoje pela manhã uma reunião com com líderes da base aliada na Câmara e no Senado, quando deve anunciar a extensão do auxílio emergencial de R$ 300 até dezembro. Como se trata de alteração de valor, será necessário o envio de uma medida provisória.
Insight Rico: Bolsonaro, Guedes e o Big Bang adiado
(por Paula Zogbi. Convidado: Paulo Gama)
Um ambiente muito quente e denso, propício para uma explosão. Essa definição pode se referir tanto à teoria do Big Bang quanto ao clima político brasileiro ultimamente.
De acordo com a hipótese do desenvolvimento do universo como conhecemos, o Big Bang foi o responsável por esfriar e expandir esse ambiente. Realmente, parece uma boa escolha de nome para o evento idealizado pelo ministro Paulo Guedes, que deveria apresentar um megapacote social e de reformas que, se funcionasse conforme o previsto, em um só dia poderia ser capaz de tornar Brasília um microcosmo mais agradável.
Mas o Big Bang Day não aconteceu, e a expectativa agora é que parte dos anúncios inicialmente planejados para a terça-feira passada sejam discutidos hoje, com algumas alterações.
Outra parte pode ganhar mais tempo para ser trabalhada: o próprio Renda Brasil, grande protagonista das discussões, pode continuar em estudo pelos próximos 4 meses – período em que se espera a manutenção do auxílio emergencial.
Impactos no mercado brasileiro
A forma como Bolsonaro, Guedes e a equipe econômica resolverão os impasses apresentados certamente vai ter impactos no mercado brasileiro nos próximos dias e meses. Para entender melhor a relação entre as partes e o que pode estar por vir, convidamos Paulo Gama, analista político, a responder 4 das perguntas que não querem calar sobre o tema.
1. Como está a relação entre governo e ministério da Economia hoje?
É uma relação marcada por instabilidade desde o começo do governo. O presidente Bolsonaro tem um histórico de pensamento, enquanto era deputado, que era um pouco diferente da posição desse time. Mas eles se juntaram em 2018 e, desde então, o ministro Paulo Guedes fez vários movimentos para marcar a necessidade da agenda dele pra manter o governo no rumo do que o time econômico espera.
Com a pandemia, tivemos a flexibilização de algumas regras fiscais e outros atores do governo começaram a exercer um pouco mais de pressão pra ampliar gastos específicos e sair um pouco da linha defendida pelo time econômico. Esses atores acabaram levando o presidente para esse caminho, ou seja, na balança do governo passou a pesar um pouco mais a pressão desse outro grupo em termos de gastos.
Além disso, diante da pandemia, o auxílio ajudou a melhorar a popularidade do presidente, e o Bolsonaro passa a resistir, por uma questão política, a como estava em 2019, quando o governo economizou o ano inteiro.
Esses dois fatores levaram o presidente a oscilar entre um ponto e outro, enquanto Guedes tentava trazer de novo o time para o norte que ele queria. Em resumo, por um lado há uma vontade política do presidente de manter algum nível de gasto – principalmente o auxílio emergencial, mas também outros, incluindo obras de infraestrutura; do outro lado, o time de Economia diz “ok, desde que caiba no teto de gastos”. Evidentemente tem um conflito. Com o crescimento dos gastos obrigatórios sobra cada vez menos espaço discricionário para o governo gastar: com menos dinheiro, a briga fica maior.
Importante lembrar que, para conseguir mudar gastos é preciso desvincular, desobrigar e desindexar, mas encontrar espaço para rever despesas que hoje são obrigatórias. Existem três alternativas: procurar programas sociais considerados menos eficientes para custear novos gastos (como o Renda Brasil); algum tipo de reforma administrativa, diminuindo o gasto com o funcionalismo público; ou flexibilizar o teto de gastos.
Então, o Paulo Guedes fica de um lado dizendo que da linha do teto de gastos não dá para passar, mas o presidente com essa dúvida sobre entrar em uma disputa ou com os beneficiários desses programas sociais ou com o funcionalismo – caminhos que ele já se mostrou indisposto a seguir.
2. O mercado teme que o teto de gastos seja extrapolado, mas como a classe política vê essa possibilidade?
Qualquer mudança no teto dependeria de uma votação de uma emenda à Constituição no Congresso, seria um movimento político não trivial.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tem dito que não colocaria em votação nada que pudesse significar uma brecha no teto, mas quando você vai discutir espaço para gastos no Congresso, isso de alguma maneira é bem visto: você tem a cúpula segurando e alguns outros líderes também, mas boa parte do Congresso estaria disposta sim a votar algo nesse sentido.
3. O que deveria ser o Big Bang Day e por que ele não aconteceu quando previsto?
O início da reunião ministerial que foi divulgada na imprensa por conta da saída do ex-ministro Sérgio Moro era sobre a formulação do Pró-Brasil. O programa nasceu lá com um caráter inicial de investimento público em infraestrutura. Ele foi um grande momento de stress, porque o Guedes inicialmente se contrapôs. Foram pelo menos cinco meses de discussão sobre o formato.
Pouco a pouco, o ministro foi assumindo os rumos do que seria esse programa, que deixou de ser investimento em infraestrutura e passou a ser um grande lançamento da agenda do governo pós pandemia, um caminho de volta da reforma com espaço para investimentos. Virou uma agenda da retomada do Brasil. O Big Bang Day na terça-feira seria o momento de mostrar essa agenda, com a criação do renda brasil dentro do teto, extinguindo outros programas sociais.
Uma série de problemas levaram ao adiamento. Primeiro, você não tinha todas as políticas formuladas. O desenho final do Renda Brasil não estava feito, o Bolsonaro não tinha topado o fim do abono e outras extinções; as definições dos enunciados e os atos não estavam prontos.
Tinha também uma briga sobre o valor e quais seriam as obras de infraestrutura contempladas com os R$ 5 a 6 bilhões que seriam remanejados – tanto que, a princípio, a ideia original era R$ 5 bilhões, e depois vimos o governo admitindo que pode passar de R$ 6 bilhões.
Não existia uma definição formal de apresentar esse pacote na terça-feira, e me pareceu um pouco precipitado o Paulo Guedes informar essa data. Não é que o evento estava de pé e foi cancelado: ele nunca esteve pronto para acontecer na terça.
Foi em meio a essa indefinição que veio a público aquela fala do Bolsonaro sobre tirar do pobre para dar ao paupérrimo e outras declarações.
4. O que monitorar agora nas próximas falas de Guedes e Bolsonaro?
O ponto de maior atenção é se houver uma decisão de caminhar para um Renda Brasil que precise fugir do teto de gastos. Com essas 3 opções postas (furar o teto, ter um programa menor ou tirar dinheiro de outro lugar – caminhos que parecem truncados), o risco é de criar algum tipo de despesa extraordinária para burlar o teto. Resumidamente, a definição sobre qual dos caminhos o Bolsonaro vai topar talvez seja a coisa mais importante. Tem uma chance dessa discussão demorar mais para acontecer.
Prorrogando o auxílio emergencial até dezembro, a grande questão é como tratar os programas sociais a partir de 2021: qualquer sinal que o Bolsonaro dê que o governo possa tentar algo que não fique 100% contemplada dentro do teto talvez seja preocupante.
A gente também monitora a relação entre os dois. Sempre que o Paulo Guedes precisa reafirmar sua posição, sua agenda, o mercado presta bastante atenção para saber se esse chamado vai ser correspondido.
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Em resumo, o momento é de atenção para as nuances do jogo político. Todos queremos saber se Paulo Guedes fica ou sai do governo, se as reformas serão aprovadas e se há tempo para contornar os problemas fiscais no Brasil. Mas, como diria Howard Marks: “atualmente, todos temos os mesmos dados a respeito do presente e a mesma ignorância no que diz respeito ao futuro”. O que podemos fazer, enquanto isso, é gerenciar os riscos e se proteger com uma carteira diversificada.
Agenda da Semana |
Terça-feira, 01 05h00: Europa – PMI Industrial 06h00: Europa- IPC 06h00: Europa – Taxa de desemprego 09h00: Brasil -PIB Trimestral 11h00: EUA – PMI industrial ISM trimestral22h30: Austrália – PIB trimestral |
Quarta-feira, 02 09h15: EUA – Variação de empregos privados 11h28: Brasil – IPC fipe mensal 11h30: EUA – Estoque de petróleo bruto 22h45: China – PMI composto |
Quinta-feira, 03 05h00: Europa – PMI composto markit 06h00: Europa – Vendas no varejo 07h00: Brasil – Produção industrial anual 09h30: EUA – Pedidos iniciais por seguro-desemprego 10h45: EUA – PMI composto markit 11h00: Reino Unido – Pronunciamento de Bailey, governador do BoE 22h30: Austrália – Vendas no varejo |
Sexta-feira, 04 09h30: EUA – Relatório de emprego (Payroll) 09h30: Canada – Variação no emprego mensal |