A reforma tributária é um assunto essencial para este ano.
Para se ter uma ideia do quão delicado é o tema, nos últimos 30 anos, todos os presidentes da república tentaram implementar uma reforma e nenhum deles conseguiu. A saber: alguns governos (incluindo o atual) até conseguiram fazer algum tipo de reforma da previdência, mas, com relação à tributária, nenhum sucesso.
E por que ela é tão importante? Porque a tributação é hoje considerada o principal componente que prejudica a produtividade brasileira.
A conclusão é fruto do relatório Doing Business (fazendo negócios, na tradução livre em português) do Banco Mundial, na qual a instituição mensura as boas práticas em diversos setores da economia entre 190 países do mundo.
O Brasil ocupa a 184ª posição do ranking no item pagamentos de impostos. Ou seja, apenas seis países estão piores que nós. Veja o desenho abaixo:
Abaixo, nossa complexidade tributária em uma amostra com 100 países:
Outro gráfico que também denota a complexidade do tema é o índice de liberdade econômica de se empreender no mundo (quanto mais puxado para o verde, melhor o ambiente). A saber: um dos componentes do índice envolve o pagamento de impostos.
O cenário brasileiro não é positivo
Não só estamos atrás de nossos vizinhos Uruguai, Paraguai e Chile, como também conseguimos ficar atrás do Afeganistão, que infelizmente é um país que já passou por algumas guerras.
Na região, só não estamos piores que nossos Hermanos e a Venezuela.
Se, por um lado, tivemos conquistas importantes nos últimos três anos, tais como a Lei do Teto dos Gastos, criação da TLP para concessões do BNDES e reforma da previdência, por outro ainda precisamos melhorar, e muito, nossa produtividade: crescemos +1,3% nos últimos três anos.
E melhorar a produtividade brasileira passa necessariamente pela transformação do sistema tributário que, hoje, vale dizer, não é um sistema “barato”.
O Brasil arrecada em tributos, proporcionalmente ao PIB, tanto quanto os países da OCDE, bloco de países desenvolvidos do qual ainda não fazemos parte.
Atualmente, três principais projetos propondo mudanças ao atual sistema encontram-se em discussão na Comissão Mista estabelecida no Congresso Nacional.
Em sua primeira etapa – da qual falaremos adiante – todas elas sugerem a criação de um Imposto de Valor Agregado (IVA) de alíquota única, a incidir sobre a totalidade de bens e serviços.
E por que sobre bens e serviços?
Porque é aqui que estão algumas das principais distorções do sistema tributário.
- Os impostos sobre bens e serviços são cumulativos, ou seja, incidem sobre todas as etapas do processo de produção de qualquer bem ou serviço. Suponha um fabricante de sapatos. A pessoa que fez a primeira parte do sapato e vendeu a carcaça pagou um imposto sobre isso. Aquela que comprou para colocar uma borracha vai pagar o imposto sobre o sapato como um todo, incluindo a carcaça. O resultado disso é que esse modelo onera muito mais a produção, já que a indústria não consegue gerar créditos sobre o imposto que já teria sido pago.
- Distorção entre estados e guerra fiscal: o principal imposto estadual é o ICMS, correspondendo a 25% da carga tributária total do país. Cada estado tem sua regra e o próprio estado pode alterar essa regra para atrair investimentos. Com isso, nós chegamos à terceira distorção.
- Alocação ineficiente de recursos: hoje, uma moto é produzida em Manaus para somente ser exportada para Argentina a partir do porto de Santos. Ou seja, menos produtividade que começou ali na guerra fiscal entre estados.
- Essa má alocação acaba pesando sobre os mais pobres: durante toda a cadeia de produção houve a incidência de vários impostos, então o bem final acaba sendo mais tributado do que os serviços. E como as famílias mais pobres, proporcionalmente, gastam mais com bens (alimentos, por exemplo) do que a população mais rica, a desigualdade ganha força.
- Ciente disso, o governo desonera alguns produtos, mas acaba gerando ainda mais distorção ao tributar “alimentos nobres”, como filé mignon e salmão.
Com isso, o IVA tenta amenizar essa fonte de desigualdade.
Na proposta do governo, ao unificar PIS e Cofins, o IVA seria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota única de 12% para todos os setores.
Na teoria, como o imposto é não cumulativo (não há o “imposto sobre imposto”), os produtos ficariam mais baratos. Além disso, o IVA também é mais simples, já que incide apenas um tributo para todos os bens e serviços – não beneficiaria um setor em específico e não geraria distorções na cadeia produtiva.
Ainda que tenha sido ventilada a possibilidade de redução do imposto de renda e mesmo a tributação de dividendos, acreditamos que o primeiro passo, que é a tributação de bens e serviços, deve gerar inúmeros ganhos de produtividade e queda da desigualdade social no médio e longo prazo.
Podemos esperar mais tempo?
Porém, a tramitação no Congresso não será fácil, afinal, estamos há 30 anos discutindo essa reforma tributária.
Na bolsa, os potenciais impactos de uma reforma tributária seriam certamente diferentes entre os setores da economia.
Mas, em geral, ainda é preciso compreender melhor como as próximas fases, incluindo a eventual desoneração da folha de pagamentos, serão desenhadas.
Por fim, gostaria de compartilhar com vocês um gráfico reproduzido pelo Banco Central, que mostra o poder das reformas estruturais na economia brasileira ao longo dos últimos três anos:
As reformas foram essenciais para a queda consistente na taxa de juros do país ao longo do últimos anos.