Você sabia que se escrevermos no Google “por que as mulheres não podem”, as primeiras frases mais procuradas que aparecem na busca incluem “ser padres, ser marinheiros ou usar um shampoo de homem para queda de cabelos”?

De fato, algumas são indagações importantes, outras nem tanto, mas admito que fiquei feliz quando não encontrei entre as mais procuradas o termo “por que mulheres não podem investir”.

E por que essa busca aparentemente aleatória é relevante? Porque, nesse texto, falaremos de investimentos femininos. Sim, mulheres investindo, rumando não somente a independência financeira, mas também a independência da gestão do nosso dinheiro.

Queremos saber tudo!

No Brasil, apesar de sermos hoje mais de 1,4 milhões de investidoras na Bolsa, as mulheres ainda representam apenas 24,9% do total de investidores registrados na nossa bolsa, a B3. No Tesouro Direto, a proporção é um pouco maior, mas próximo ao encontrado na B3, em 27%. Em um país onde mulheres representam 51,5% do total da população, e no qual quase metade das famílias são chefiadas por mulheres financeiramente, o número ainda parece baixo.

Diversos estudos tentam entender o porquê dessa realidade, que não acontece apenas no Brasil e é infelizmente observada em todo canto, inclusive em países desenvolvidos, onde o mundo dos investimentos tende a ser muito mais maduro e presente na vida das pessoas.

Dentre os motivos, as pesquisas apontam menores salários e menores benefícios de aposentadoria de mulheres quando comparados à homens, o menor nível de educação financeira, acesso à informação e capacidade de utilizá-la, e mesmo variáveis de interação social que afligem parte da população feminina, incluindo sintomas de depressão.

Mas há outra questão que também aparece com frequência, que decidi chamar de “síndrome do PhD dançarino”. Sabe aquela sensação de que você precisaria saber dançar muito bem para poder participar de uma competição de dança entre amigos? Agora substitua a competição de dança por dar o primeiro passo no mundo dos investimentos, e saber dançar muito bem por ter um PhD em economia, finanças ou correlatos. Voilà!

É isso que 41% das mulheres no mundo sentem sobre investimentos, segundo uma pesquisa da gestora Franklin Templeton [2]. Ou seja, para quase metade das mulheres, elas não sabem o suficiente sobre investimentos para “se dar ao luxo de investir”. Sabem qual o número que a mesma pesquisa aponta para homens? 23%.  

Mas será que investimos diferente?

Para além das variáveis por trás da menor participação feminina em investimentos, há também um importante “lugar comum” frequentemente atrelado a investidora feminina: a premissa de que a mulher possui maior aversão ao risco do que homens. Ou seja, mulheres teriam mais medo de perder dinheiro ao investir, e por isso, tomariam menos riscos em nossos investimentos.

Essa premissa acaba influenciando a própria decisão inicial de mulheres sobre investir, além de criar a noção de que os retornos esperados em carteiras escolhidas por mulheres são menores, quando comparado às carteiras em que homens decidem sobre a alocação. Em outras palavras: partindo do pressuposto que mulheres optam por tomar menos riscos, espera-se menores retornos de investimentos feitos por mulheres.

Mas será que isso é realmente o caso, na vida real? Usando um banco de dados com carteiras de investimento reais de mulheres ao redor do Brasil, e um modelo matemático, conclui que (infelizmente) sim. E isso se provou verdade mesmo controlando por variáveis como idade, estado civil e salário declarado.

Simplificando para o bom e velho português: “Considerando a mesma idade, estado civil, salário e várias outras coisas, uma mulher é mais avessa ao risco do que um homem”? Sim.

Um sonoro “sim” seria escutado, se o modelo estatístico rodado em uma tela preta que faz todo mundo parecer um hacker pudesse falar. Para todos os diferentes testes realizados, mulheres se mostraram mais avessas ao risco do que homens.

Quanto? Considerando clientes de perfil autodeclarado agressivo, por exemplo, ser mulher implica em uma redução da volatilidade observada, em média, de 2,23 pontos percentuais. Esse aumento se compara a uma redução de 0,57 pontos percentuais na volatilidade observada, a cada 10% de aumento no patrimônio líquido do cliente.

Ou seja, o mero fato de ser mulher influencia mais para que uma carteira tenha menor volatilidade do que o próprio montante investido.

Exato! Chocamos. Por isso, se isso te deixou tão estupefata(o) quanto eu, convido você, cara leitora ou caro leitor, a investir sem preconcepções. Sem síndromes de PhDs dançarinos, ou medo de dar aquele primeiro (segundo, ou terceiro) passo: medindo o risco/retorno de maneira equilibrada de acordo com seus objetivos, fazendo seu dinheiro trabalhar com você, por você – sendo homem, mulher, velho, novo, careca, cabeludo, rei, ladrão, soldado ou capitão!

Referências

[1] O conceito de gênero utilizado no presente estudo diz respeito à construção social atribuída ao sexo (diferente do conceito de sexo biológico), conforme a autodefinição de investidores.

[2] 41% das mulheres dizem saber menos do que a média dos investidores. Valor Investe, 2019. https://valorinveste.globo.com/mercados/brasil-e-politica/noticia/2019/10/01/41percent-das-mulheres-dizem-saber-menos-do-que-a-media-dos-investidores.ghtml

Elaborado por:

Bruna Sene, CNPI-T 1847

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