O Dia das Crianças é uma das datas mais aguardadas no Brasil, tanto pelas famílias quanto pelo comércio. Segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC), é a terceira maior data do varejo, atrás apenas do Natal e do Dia das Mães, movimentando R$ 9,3 bilhões em 2024.
Com tanto peso econômico, não é surpresa que os preços dos presentes e guloseimas sejam monitorados de perto. Junto com a alegria das crianças, vem a dúvida para os pais: quanto a inflação encareceu os presentes, doces e produtos característicos da data?
Para entender o impacto da inflação, montamos uma cesta do Dia das Crianças, alguns itens que são característicos para a comemoração. O resultado? A cesta subiu 39,09% desde 2020 até agosto de 2025, levemente acima do índice geral (37,66%). Vale destacar que, com os dados de inflação referentes a agosto de 2025, a cesta apresentou uma aceleração superior à do IPCA. Mas, por dentro dos itens, há histórias bem diferentes.
O dia é das crianças, mas a surpresa é para o bolso dos pais
Quando olhamos para a inflação do Dia das Crianças em 2025, o primeiro passo é visualizar a evolução do conjunto de itens que marcam a data. Para isso, reunimos em uma cesta os principais produtos consumidos ou presenteados nesta época: brinquedos, roupas infantis, sapatos, doces, livros, bicicleta, instrumentos musicais e videogames. Para comparação com o índice geral, o IPCA, fizemos uma média simples com os itens característicos da data.
Desde 2020, a cesta acumulou alta de 39,09%, em linha com o IPCA geral no mesmo período, de 37,66%. Ou seja, no agregado, os gastos típicos do Dia das Crianças não fugiram muito da inflação média da economia. Mas por dentro dessa média existem diferenças expressivas: alguns itens subiram muito mais, outros menos, e até houve quedas pontuais.
Essa leitura mostra como a inflação não é uniforme — ela reflete pressões distintas em cada setor da economia. Enquanto doces foram afetados por commodities agrícolas, brinquedos dependeram de câmbio e logística, roupas sentiram a pressão da cadeia têxtil, e videogames responderam à demanda tecnológica e à oscilação do dólar.
A tabela abaixo apresenta a visão consolidada da cesta:

Olhando os números acima, dois pontos merecem destaque:
- A estabilidade relativa da cesta: no agregado, ela se manteve alinhada ao IPCA, mostrando que, apesar das pressões específicas, não houve distorção estrutural no conjunto.
- Os destaques dentro da cesta: enquanto os doces dispararam (+74,8% e +73,3% em cinco anos), os brinquedos e as roupas infantis surpreenderam e aceleraram menos que o índice geral da inflação (+21% e 28,9% em cinco anos).
Essas diferenças são o que tornam a análise interessante: cada categoria da cesta responde a um conjunto de fatores distintos — do mercado global de commodities ao câmbio, passando pelo comportamento do consumidor e pelas estratégias do varejo. É justamente essa diversidade que vamos detalhar a seguir.
Doces: o lado doce que pesa no bolso
Difícil imaginar o Dia das Crianças sem chocolate, bombons ou sorvete. Mas é justamente aqui que mora um dos maiores vilões da inflação. O segmento de doces e guloseimas foi o que mais pesou no bolso no Dia das Crianças. O preço do chocolate em barra e bombom subiu +74,8% desde 2020 e +23,4% nos últimos 12 meses, enquanto o sorvete acumula +73,3% em cinco anos, com uma alta de +2,9% em 2025.
Essas altas têm explicação no cenário global — o açúcar, um dos principais insumos da indústria, sofreu choques de oferta com exportações recordes do Brasil em 2024 e quebras de safra em países que também são grandes produtores da commodity, como Índia e Tailândia.

Já o cacau viveu um dos maiores ciclos de alta da história recente, com colheitas reduzidas na Costa do Marfim e em Gana, que juntos concentram cerca de 60% da produção mundial. O resultado foi um encarecimento expressivo das guloseimas, transformando o lado mais simbólico da comemoração infantil em um dos maiores pesos na inflação para a data.
Ou seja, a parte mais doce da festa virou também a mais salgada para os bolsos.
Os presentes que criança não gosta e os pais adoram
Roupas dificilmente são o presente preferido das crianças, mas acabam sendo quase inevitáveis para os pais. Roupas infantis, vistas como um “presente útil”, tiveram um comportamento mais benigno do que o IPCA quando olhamos o período mais longo. A categoria roupa infantil acumula +28,89% desde janeiro de 2020, contra +37,66% do índice geral, e mostra +2,97% nos últimos 12 meses e leve alta em 2025 (+1,14%).
Essa combinação pode ser explicada por dois fatores atuando ao mesmo tempo: de um lado, custos estruturais da cadeia têxtil (tecidos, químicos, energia e logística) que pressionaram os preços no pós-pandemia; de outro, uma competição muito intensa no varejo — especialmente com o avanço do e-commerce e a maior sensibilidade de renda das famílias — que limitou o repasse integral desses custos e manteve a categoria “girando” abaixo do IPCA no horizonte mais longo.

Quando abrimos a gaveta por peça, as diferenças ficam claras. Calça comprida infantil ficou acima da média do grupo.
| Consolidado | A partir de jan/20 | Acumulado 12 meses | 2025 |
| Roupa infantil | 28,89% | 2,97% | 1,14% |
| Calça comprida infantil | 32,17% | 3,42% | 4,57% |
Calças concentram mais tecido por unidade, têm um ciclo de reposição relativamente rápido (rasgos e desgaste) e sofrem com oscilações de insumos e de mão de obra ao longo das coleções; isso explica por que resistem mais a quedas de preço e carregam altas mais persistentes.
Já o agasalho infantil mostra um comportamento mais estável nos últimos 5 anos e um movimento deflacionário no curto prazo, ou seja, uma queda nos preços:
| Consolidado | A partir de jan/20 | Acumulado 12 meses | 2025 |
| Roupa infantil | 28,89% | 2,97% | 1,14% |
| Agasalho infantil | 18,88% | -6,36% | -1,25% |
A queda em 12 meses é típica de ciclos de liquidação de inverno mais agressivos após um período de demanda mais fraca, enquanto a alta no ano corrente indica reposição de margens com a chegada das novas coleções de inverno.
Nas peças casuais, bermudas e camisas, a deflação apareceu com mais nitidez. Aqui, a explicação ocorre de uma disputa de preços direta — alto volume, muitas marcas, forte presença de marketplaces — e a estratégia de giro rápido com tickets mais baixos favorece quedas pontuais mesmo em ambiente de custos elevados.
O que explica essa diferença? Esse comportamento mostra como o setor de vestuário é afetado tanto por custos globais de matérias-primas (tecidos, energia, logística) quanto por estratégias do varejo. A concorrência acirrada e a busca por manter produtos acessíveis em datas de grande apelo ajudaram a conter aumentos em algumas categorias — ainda que, estruturalmente, a cadeia têxtil siga pressionada por insumos.
Os sapatos infantis caminham acima do IPCA no longo prazo:
| Consolidado | A partir de jan/20 | Acumulado 12 meses | 2025 |
| Roupa infantil | 28,89% | 2,97% | 1,14% |
| Sapato infantil | 41,25% | 4,85% | 2,51% |
O segmento é mais sensível a insumos como couro, borracha e PVC (derivados de petróleo), além de frete e energia — itens que tiveram choques relevantes no ciclo 2021–2023. Ao mesmo tempo, há uma particularidade de demanda na categoria infantil: pés infantis crescem rápido, o que torna a reposição inelástica para muitas famílias; essa necessidade constante costuma sustentar volumes mesmo em períodos de renda pressionada, permitindo que a indústria preserve parte das margens no horizonte longo.
Em síntese, o vestuário infantil ficou abaixo do IPCA desde 2020, pressionado pela alta concorrência e pelo ritmo acelerado de lançamentos, que impulsionaram descontos e uma recomposição seletiva de preços. Já os calçados acompanharam a inflação, sustentados pelo peso dos insumos industriais e por uma demanda de reposição mais consistente.
Dentro do armário, no entanto, o comportamento é heterogêneo: peças com maior uso de tecido ou sujeitas a desgaste intenso (como calças) continuam pressionadas; itens casuais e básicos, expostos à guerra de preços do e-commerce, apresentaram queda no curto prazo; a moda de tendência oscilou conforme o calendário de coleções; e os sapatos, após o choque de custos, estabilizaram ao longo do ano, refletindo a combinação entre concorrência e algum alívio nos preços dos insumos.
E os mais queridos: brinquedos
Quando o assunto é Dia das Crianças, os brinquedos estão sempre no centro. Os brinquedos tradicionais tiveram uma variação acumulada abaixo do IPCA no mesmo período, e praticamente estáveis no acumulado recente:
| Consolidado | A partir de jan/20 | Acumulado 12 meses | 2025 |
| Índice geral – IPCA | 37,66% | 5,13% | 3,15% |
| Brinquedo | 20,93% | 1,51% | 2,46% |
Esse resultado reflete a transformação do setor nos últimos anos: houve uma maior oferta de itens de baixo valor agregado, sobretudo de marcas nacionais e importados de menor custo, que ganharam espaço nas gôndolas. Segundo a Abrinq, mais da metade das vendas do setor em 2024 foi de brinquedos até R$ 50, um movimento que ajuda a explicar por que os preços médios cresceram menos que a inflação geral.
Além disso, a desaceleração da demanda em um contexto de juros altos e renda disponível pressionada reduziu o espaço para reajustes agressivos. Em contrapartida, brinquedos mais elaborados, como bicicletas e instrumentos musicais, mostraram inflação mais próxima ou até superior ao IPCA, refletindo a influência de insumos industriais (aço, alumínio, plásticos) e custos logísticos, que continuam sendo um gargalo estrutural no país. Já os livros didáticos tiveram aceleração recente (+5,7% em 12 meses), refletindo custos de papel e reajustes no setor educacional.
Em suma, esses produtos sofrem mais com a pressão de commodities industriais (aço, alumínio, papel) e custos de logística, fatores que os tornam mais vulneráveis a choques de oferta.
Videogames: os queridinhos mais caros
Se existe um sonho de consumo no Dia das Crianças, são os videogames. E eles também figuram entre os itens que mais pesaram. Os consoles subiram 27,65% desde 2020, mas o destaque está na alta de 6,75% em apenas 12 meses.
Aqui, o fator determinante é o câmbio. Como consoles e jogos são importados, a variação do dólar é rapidamente repassada ao consumidor brasileiro. Além disso, a mudança nos padrões de consumo infantil — em que crianças passam a desejar eletrônicos e gadgets típicos do mundo adulto — ampliou a demanda por tecnologia, pressionando mais os preços.

O resultado é uma categoria que se tornou símbolo da mudança de hábitos e da pressão inflacionária em produtos de maior valor agregado.
E agora, como ficam os presentes?
A inflação do Dia das Crianças mostra que o impacto no bolso das famílias vai muito além de números isolados. Enquanto a cesta como um todo acompanhou o IPCA, os detalhes revelam contrastes importantes:
- Doces e guloseimas subiram muito acima da média, representando a pressão que os alimentos fazem na inflação geral.
- Brinquedos simples e roupas infantis ajudaram a aliviar a conta.
- O movimento foi guiado por commodities globais (açúcar, cacau, aço, papel), variações cambiais, estratégias comerciais do varejo e mudanças de comportamento dos consumidores.
Planejamento e escolhas inteligentes podem fazer a diferença: antecipar compras, comparar preços e considerar alternativas educativas ou experiências são formas de celebrar a data sem comprometer o orçamento. Afinal, no fim das contas, o que fica não é o valor do presente, mas as memórias que ele ajuda a construir.
Mas, afinal, como transformar o limão da inflação em uma boa limonada financeira? Para proteger o poder de compra, se torna essencial olhar para a inflação também nos investimentos. Para objetivos de médio e longo prazo, os produtos atrelados ao IPCA são aliados importantes, pois acompanham a evolução dos preços e ajudam a preservar o valor real do patrimônio. Já para metas de curto prazo, como compras sazonais ou reservas emergenciais, as opções pós-fixadas oferecem liquidez e segurança em um cenário de juros elevados. Pensando nisso, confira nossa carteira recomendada de renda fixa, com sugestões alinhadas ao seu perfil e aos diferentes horizontes de investimento.