Por Sol Azcune, analista de política internacional da XP
- Há 52 anos e 1 dia, em 20 de julho de 1969, Neil Armstrong e Buzz Aldrin deram um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade
- Bem longe da Guerra Fria, estamos vivendo um revival da corrida espacial, mas a disputa agora é entre EUA e China
- As duas potências levaram para o espaço o embate por influência geopolítica e desenvolvimento tecnológico
- E ainda tem player novo na história: o setor privado, estrelando Jeff Bezos e cia
Há 52 anos e 1 dia, em 20 de julho de 1969, Neil Armstrong e Buzz Aldrin deram um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade e foram os primeiros homens a caminhar na Lua. O evento, que foi televisionado na época, é até hoje considerado uma das principais conquistas no espaço e um marco para a ciência e tecnologia. O que nem sempre lembramos é que só chegamos lá devido ao à Guerra Fria e a corrida espacial entre os Estados Unidos e União Soviética – tema que volta a ganhar relevância no contexto da competição entre os Estados Unidos e o novo superpoder na parada, a China.
Com o novo impulso na tecnologia espacial, o novo eixo de competição entre os países deve continuar a ganhar relevância e crescem as expectativas: Será que o próximo grande marco espacial está por vir? Esse avanço virá pelas mãos dos EUA ou da China? Ou será que grandes empresários, que também se juntam à disputa em 2021, terão mais sorte?
Mais uma vez, as disputas tecnológicas terão impacto simbólico, já que as duas maiores economias do mundo buscam afirmar sua liderança em inovação por meio deles. Assim como na política e economia, a disputa na nova corrida espacial tem um longo percurso pela frente.
No último capítulo da corrida espacial…
A primeira corrida espacial foi apenas um dos vários eixos de competição entre os Estados Unidos e a União Soviética durante o período de fortes tensões políticas e ideológicas que dominaram o cenário internacional entre 1947 e 1991.
Porém, o espaço ocupava um lugarzinho especial no coração dos governos: além de ser uma nova fronteira para os desenvolvimentos tecnológicos da época, os avanços espaciais tinham enorme poder político por atraírem atenção do público, e foram considerados importante ferramenta de ‘soft power’ (ou poder de influência). Não há um nítido vencedor na disputa, mas fica claro que a chegada dos EUA à lua teve enorme impacto político, midiático e social – olha a gente aqui falando disso mais de meio século depois.
Influenciado por esse impacto, poucos anos depois do homem chegar à lua as superpotências mudaram a estratégia e passaram a privilegiar a cooperação, deixando de lado a busca por protagonismo, uma tendência que predominou até a queda da URSS em 1991. Em seguida, os EUA desfrutaram de um período em que não tiveram que se preocupar pela competição pelos holofotes espaciais. Mas é claro que isso não durou muito tempo…
China, a nova potência
Já nos anos 2000, a ascensão da China ameaçou o status quo da hegemonia americana, o que levou ao início de um novo período de tensões na geopolítica.
Apesar da relação entre as maiores economias do mundo não ser uma guerra fria, os paralelos entre esse novo período de tensões que estamos vivendo e o antigo são vários. Competição industrial e tecnológica? Temos. Debates ideológicos? Temos. Luta por maior influência econômica e diplomática em diversas regiões? Temos. E, mais uma vez, temos também competição por avanços no espaço, que volta a ser considerado importante palco para demonstração de poder.
Vale notar ainda que economias americanas e chineses são muito mais interdependentes do que as economias americanas e soviéticas jamais chegaram a ser. No entanto, na seara espacial, não há esse mesmo nível de conexão, devido a uma lei americana aprovada em 2011 que não permite cooperação entre os países nesse ramo. Portanto, o espaço é agora um palco onde os países podem demonstrar suas capacidades individualmente, algo que Pequim especialmente tem considerado altamente relevante.
Um novo fôlego para a corrida espacial
A China tem acelerado seu programa espacial de forma surpreendente, e reacendeu a corrida espacial lançando neste ano sua primeira estação espacial e se tornando o segundo país aterrissar um rover em Marte. Um dos próximos passos, segundo autoridades, seria convidar astronautas de outros países a participarem de missões conjuntas, em nova inciativa diplomática.
Nos EUA, onde programa da Nasa é mais antigo, há receios que o rápido crescimento chinês possa implicar uma ameaça ao domínio americano, o que incentivou novas parcerias com privados e reanimou ânimos de missões a Marte.
Coincidentemente, o recente impulso no programa espacial americano espelha uma tendência de crescimento na percepção negativa da China e defesa de linha mais dura na política dos EUA para combater a influência chinesa, tema que ocupou espaço relevante no debate eleitoral em 2020 e hoje é um dos poucos assuntos sobre qual há consenso no Congresso do país. Nesse contexto, os EUA estão alocando um maior número de recursos públicos para tecnologia e inovação para não ficar para atrás na corrida — a espacial é mais uma das disputas.
Ou seja, ainda que em um novo contexto, os avanços espaciais devem estar amarrados mais uma vez a um contexto político de antagonismo entre países superpoderosos.
Outro fator relevante a levar em consideração quando falamos da nova corrida espacial é a presença de terceiros, especificamente, grandes empresários como Jeff Bezos, Elon Musk e Richard Branson, que também buscam acelerar avanços no espaço. Ainda engatinhando em comparação às agências estatais, a corrida espacial privada promete trazer conquistas com novo viés comercial, explorando viagens turísticas espaciais. A participação de bilionários famosos gera entusiasmo sobre a exploração espacial e coloca a corrida em destaque — não à toa, Bezos escolheu o aniversário do homem na lua pra se lançar além da atmosfera — incentivando maior atuação dos Estados.
Tendo isso em mente, não se espera que a corrida espacial tenha um vencedor tão cedo — a briga por protagonismo político e domínio econômico entre as nações ainda está em estágios iniciais e tem um longo caminho a percorrer a medida que as maiores economias do mundo se ajustam a uma nova dinâmica de poderes, enquanto a crescente influência do setor privado nas dinâmicas internacionais é refletida na participação de terceiros na disputa.
Elaborado por:
Bruna Sene, CNPI-T 1847
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