Já não é de hoje que a Americanas (AMER3) está sob os holofotes dos investidores. A empresa protagonizou um dos maiores escândalos do mercado de capitais brasileiro em janeiro de 2023, com a descoberta de uma dívida bilionária e fraudes nos balanços.

Contudo, não foi apenas o evento de 2023 que causou forte oscilação nos preços das ações da varejista. Desde então, uma série de acontecimentos tem contribuído para a volatilidade nos preços dos papéis. Como consequência, Americanas (AMER3) já acumula queda de mais de 99% desde a descoberta da fraude.

Mas afinal, o que está acontecendo na Americanas e como está a situação da empresa agora? Vamos entender alguns fatos nesse texto, tais como:

– Fato mais recente: efetivação do grupamento de ações

– A divulgação mais recente de resultados

– Como está a situação da empresa diante do cenário atual?

– Relembrando a história para entender a situação atual da Americanas

– A investigação do caso

– O plano de recuperação judicial

– Como está a situação atual da empresa?

– Recomendação do nosso time

Fato mais recente: efetivação do grupamento de ações

O fato mais recente para a Americanas foi a efetivação do grupamento de ações anunciado em maio de 2024.

Como parte do plano de recuperação judicial da empresa, no dia 27 de agosto de 2024 haverá o grupamento das ações ordinárias da AMER3.

O que é grupamento de ações?

O processo de grupamento (ou inplit) é um evento corporativo bem comum na bolsa de valores, mas muitos investidores não conhecem a respeito. Ocorre quando a empresa diminui o número de ações emitidas, aumentando proporcionalmente o preço de cada uma delas – não alterando, assim, o patrimônio do investidor ou do capital social da empresa.

Exemplo: Um investidor, possuía 200 ações de EXPL4, cada uma valendo R$0,10. A empresa, então, realizou o grupamento de suas ações na proporção de 50 para 1, ou seja, a cada 50 ações que os acionistas possuíam, passaram a ter somente 1. Após o processo, então, o investidor terá somente 4 ações, com o valor unitário de R$5 cada.

Note que, mesmo depois do grupamento, o valor aplicado por ele na empresa seguiu sendo R$20.

No caso da Americanas (AMER3), o grupamento de ações ocorrerá na proporção de 100 para 1. Ou seja, considerando o preço do fechamento da segunda-feira dia 26/08 em R$0,05, após o grupamento as ações serão negociadas a R$5,00.

Mas o que leva uma companhia a alterar o número de ações se não ocorre nenhuma mudança no total de dinheiro aplicado pelos acionistas?

O principal motivo é controlar a volatilidade do papel, uma vez que haverá menos papeis da empresa em circulação. Assim, o objetivo desse movimento é reduzir a volatilidade das ações e deixar de ser considerada uma “penny stock”, classificação dada pela B3 a ações que negociam abaixo de 1 real.

Sempre que uma ação é negociada por menos de R$ 1 por 30 pregões consecutivos, a empresa emissora dos papéis é notificada pela B3.

Embora seja um procedimento padrão da bolsa brasileira para evitar a alta volatilidade de ações que estão abaixo de 1 real, nem tudo são flores. Um ponto negativo do grupamento de ações é que, embora possa aumentar o preço de cada ação e facilitar as negociações, pode criar uma percepção negativa entre os investidores e levar a novas quedas nos preços.

Isso ocorre porque alguns investidores podem ver o aumento do preço como uma tentativa da empresa de “esconder” o fato de que as ações estão desvalorizadas. Essa interpretação pode prejudicar a confiança dos investidores na companhia.

Por outro lado, alguns investidores podem olhar para a melhora na negociabilidade das ações como um ponto positivo, o que pode gerar pressão compradora. E é justamente o que está ocorrendo no primeiro dia de negociação das ações “pós grupamento”. Os papéis chegaram a subir mais de 40%.

Além desse evento, outras divulgações mexeram com os preços das ações recentemente, como a divulgação dos resultados.

A divulgação mais recente de resultados

Depois de adiar diversas vezes, no dia 14 de agosto de 2024 a Americanas divulgou seus resultados referentes a 2023 e ao primeiro semestre de 2024.

A Americanas (AMER3) reportou prejuízo de R$ 2,272 bilhões no ano de 2023. O prejuízo reportado é 82,8% menor em relação a 2022, considerando os números reapresentados após a descoberta da fraude de resultados.

Já no primeiro semestre de 2024, a varejista teve um prejuízo de R$ 1,4 bilhões. Número 55,9% menor ante mesmo período de 2023.

Segundo comunicado apresentado pela própria empresa, “os últimos 18 meses foram marcados por grandes desafios: a revelação de inconsistências contábeis, que posteriormente foram identificadas como uma complexa fraude de resultados, a Recuperação Judicial e a necessidade de reconstrução da Americanas. Esses eventos impactaram o resultado do período, com queda relevante na receita e contabilização de prejuízos recordes”.

Além disso, a varejista decidiu retirar suas projeções financeiras (guidance) para os próximos meses, o que gerou insegurança entre os investidores com relação a companhia.

Após a divulgação dos resultados e do anúncio da retirada do guidance, Americanas (AMER3) caiu mais 57,58%, saindo de R$0,33 para R$0,14 no encerramento do pregão do dia 15 de agosto de 2024.

Apesar da retirada do guidance, que trouxe muitas incertezas aos investidores, a gestão da Americanas afirmou que passou a se concentrar apenas na operação da rede de varejo e pode retomar as previsões de resultados em breve.

Como está a situação da empresa diante do cenário atual?

Do ponto de vista do cenário macroeconômico, apesar de termos um ambiente mais favorável para ativos de risco atualmente devido a alguns fatores como:

I) diminuição dos ruídos políticos no Brasil;

II) volta do fluxo estrangeiro para a bolsa brasileira;

iii) expectativa de início de corte de juros nos Estados Unidos em setembro.

No Brasil, o mercado espera que o Banco Central aumente os juros novamente. Nosso time de economia estima que a Selic deve terminar o ano de 2024 em 11,75% (o que representa uma alta de 1,25% com relação ao atual nível dos juros). Essa alta nos juros pode afetar negativamente as empresas do setor de varejo.

A alta nos juros, como a Selic, afeta negativamente as varejistas por várias razões:

Aumento do Custo do Crédito: Com a Selic mais alta, os empréstimos e financiamentos se tornam mais caros. Isso pode reduzir o consumo, já que os consumidores tendem a gastar menos quando o crédito está mais caro.

Redução do Poder de Compra: Quando os juros sobem, as parcelas de dívidas existentes (como cartões de crédito e empréstimos) aumentam, o que reduz o poder de compra dos consumidores. Isso pode levar a uma diminuição nas vendas no varejo.

Menor Investimento em Expansão: As empresas de varejo podem adiar ou cancelar investimentos em expansão e melhorias, já que o custo de financiamento se torna mais alto. Isso pode afetar o crescimento a longo prazo.

Mudança no Comportamento do Consumidor: Em um cenário de juros altos, os consumidores tendem a ser mais cautelosos com os gastos e podem priorizar produtos essenciais em vez de itens de luxo ou não essenciais.

Impacto na Margem de Lucro: Se os custos de financiamento aumentam, as varejistas podem enfrentar margens de lucro menores, especialmente se não conseguirem repassar esses custos para os consumidores.

Esses fatores combinados podem criar um ambiente desafiador para as varejistas, resultando em vendas mais baixas e, consequentemente, impactando seus resultados financeiros.

Relembrando a história para entender a situação atual da Americanas (AMER3)

Vale recapitular alguns acontecimentos da “novela Americanas” para entender o que está acontecendo com a empresa agora. Para isso, vamos voltar ao primeiro capítulo dessa saga:em 11 de janeiro de 2023, a Americanas (AMER3) comunicou ao mercado a descoberta de “inconsistências contábeis”, anunciadas a princípio no valor de 20 bilhões de reais.

Após essa descoberta, no dia 12 de janeiro, investidores institucionais e pessoas físicas correram para se desfazer dos papéis e as ações da Americanas (AMER3) terminaram o pregão em queda de 77,3%. Saíram de R$12,00 para R$2,72.

Nesse momento, diversos credores também correram para exigir a quitação antecipadas das dívidas. Vale lembrar que a lista de credores da Americanas é extensa, dentre eles estão grandes bancos como Banco do Brasil, Bradesco e Itaú, além de outros fornecedores como Samsung e Apple.

Em resposta, no dia 19 de janeiro de 2023, a Americanas entrou com um pedido de recuperação judicial.

O que é recuperação judicial?

A recuperação judicial é um processo que permite que uma empresa em dificuldades financeiras busque reestruturar suas dívidas e continuar suas operações. O objetivo é evitar a falência, proporcionando um plano de recuperação que deve ser aprovado pelos credores. Durante esse período, a empresa tem proteção contra ações judiciais e cobranças, enquanto trabalha para se reerguer financeiramente.

Nesse dia, as ações já estavam acumulando queda superior a 90% (desde 12/jan). No mesmo 19 de janeiro, as ações da Americanas foram retiradas de diversos índices do mercado de ações brasileiro, como o Ibovespa (IBOV), Índice de Consumo (ICON), entre outros.

A investigação do caso

Após um ano e meio de apuração sobre a fraude contábil, o comitê independente da Americanas apresentou os resultados da investigação. De acordo com fato relevante, o Comitê confirmou a existência de fraude contábil.

Diante das evidências apresentadas, o Conselho orientou a Diretoria da Americanas, juntamente com seus advogados, a tomar as providências necessárias para a comunicação às autoridades competentes – Ministério Público Federal, Polícia Federal, Comissão de Valores Mobiliários e demais autoridades.

E durante esse processo, Miguel Gomes Pereira Sarmiento Gutierrez, ex-CEO das Lojas Americanas, junto com a ex-diretora Anna Christina Ramos Saicali e outros ex-executivos foram acusados de atuarem em esquema de manipulação dos balanços para ocultar a situação financeira da varejista que resultaram em um rombo de aproximadamente R$ 20 bilhões, enquanto a dívida total da empresa em recuperação judicial é de R$ 40 bilhões.

O plano de recuperação judicial da Americanas

Quando a empresa envolvida em um problema de natureza financeira não tem os recursos suficientes para cumprir os pagamentos devidos, em valor ou no prazo estabelecido, ela pode pedir recuperação judicial.

A primeira versão do plano de recuperação da Americanas (AMER3) foi apresentada em março de 2023, mas sua aprovação só ocorreu em 19 de dezembro de 2023, após exatos 11 meses.

Ou seja, a Americanas levou quase todo o ano para negociar os acordos que buscam sanar os R$ 50 bilhões em dívidas (valor final apresentado pela empresa), entre aproximadamente 16,3 mil credores. Entre esses credores estão fornecedores, investidores, prestadores de serviços, além de dívidas com microempresas e empresas de pequeno porte, dívidas trabalhistas e com outros credores comerciais.

O processo de recuperação judicial da Americanas (AMER3) é complexo e envolve várias etapas e partes interessadas. Durante esse processo, novas medidas vão sendo anunciadas e novos cronogramas sendo lançados. Mas, vale entender algumas das propostas feitas pela empresa para tentar estabilizar suas operações e reerguer a companhia. Vamos conhecer algumas delas:

Venda de Ativos

O processo de recuperação judicial envolverá a venda de ativos. A Americanas está avaliando quais ativos não essenciais podem ser vendidos. Isso pode incluir imóveis, filiais ou até mesmo marcas que não são estratégicas para o core business da empresa.

Inicialmente o Hortifruti Natural da Terra e a Uni.Co (empresa de franquias das marcas Imaginarium e Puket) foram incluídos nesse processo de vendas, que ainda não foi concluído.

Durante uma conferência com investidores, Leonardo Coelho, atual CEO da Americanas, falou que “Não será venda de liquidação. Venderemos se acharmos a venda certa, no preço certo”,

Os recursos obtidos com a venda de ativos serão direcionados para reduzir a dívida da empresa e melhorar sua liquidez, ajudando na implementação do plano de recuperação.

Aumento de Capital e Aporte dos acionistas de referência

Em mais um passo dado no processo de recuperação judicial, foi aprovado em julho de 2024 o aumento de capital da companhia.

A proposta, aprovada em maio durante uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE), contou com a emissão de mais de 18 bilhões de ações da Americanas (AMER3), com um preço de R$ 1,30 cada.

Desse total, aproximadamente 9 bilhões de ações foram novas e subscritas pelos credores da empresa, por meio da capitalização de novos créditos.

Capitalização de novos créditos é o processo em que uma empresa converte dívidas ou créditos em capital próprio. Isso geralmente ocorre quando credores aceitam transformar seus créditos (valores devidos pela empresa) em ações da companhia.

O restante do aumento de capital foi composto por novas ações adquiridas pelos acionistas existentes. Com essa operação, o aumento de capital alcançou R$ 24,460 bilhões.

É importante destacar que os acionistas de referência Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira se comprometeram a investir pelo menos R$ 12 bilhões na empresa.

Outro fator que gerou pressão vendedora recentemente nas ações, foi a venda dos papéis por parte dos credores que haviam recebido ações nessa etapa do processo de recuperação judicial (como parte do pagamento da dívida que a Americanas tinha com eles). Grandes bancos – que são credores da empresa – como o Santander e BTG, anunciaram que realizaram essas vendas. 

Como está a situação atual da Americanas?

Atualmente, a Americanas está na “fase de execução” de seu plano de recuperação judicial, trabalhando na negociação com credores e na estabilização de suas operações. A situação é dinâmica e sujeita a mudanças conforme novos desenvolvimentos e negociações ocorrem.

O aumento de capital e grupamento mais recente das ações fazem parte do processo de recuperação da empresa, que é crucial para a sobrevivência da companhia no longo prazo e está sendo acompanhado de perto pelo mercado e pelos investidores. Contudo, esse é um processo complexo e demorado, que ainda gera diversas incertezas para a empresa.

Recomendação do nosso time

O time de análise do setor de varejo da XP Inc mantém a cobertura de Americanas (AMER3) sob revisão, já que ainda existem diversas incertezas sobre todo o processo de recuperação da companhia.

Veja aqui as ações recomendadas pelo nosso time.

Elaborado por:

Bruna Sene, CNPI-T 1847

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