Insight Rico: Brasil, você não é todo mundo!
(por Rachel de Sá, economista da XP Inc. e convidada especial deste Rico Matinal)
– Eu preciso ir nessa festa! Vai todo mundo!
– Quantas vezes eu preciso repetir? Você não é todo mundo!
Se você (também) cresceu bolando argumentos para convencer sua mãe de porque você absolutamente precisava comparecer a um número incrivelmente grande de eventos sociais para uma criança, tenho certeza que já ouviu ela falar isso ao menos uma vez na vida. Ou, no meu caso, algumas muitas vezes ao longo da vida – confesso que ouço até hoje!
É basicamente isso que eu sinto quando me perguntam sobre os motivos por trás de tanta preocupação com a saúde das contas públicas do Brasil no pós-pandemia. Se os EUA, o Japão, a União Europeia, e vários outros países desenvolvidos (ou seja, TODO MUNDO) estão aumentando o endividamento até mais do que nós, e considerando estender os estímulos para além deste ano, por que quando falamos em fazer o mesmo por aqui, o pessoal dá “uma surtada”?
Simples: porque você (amado Brasil), não é todo mundo! E, nesse caso, tampouco o são boa parte do restante dos países além dos citados acima – especialmente, os emergentes.
Passada minha preocupação de que posso estar lentamente me metamorfoseando em minha mãe (respira, inspira, não pira!), explico. Sabemos que o ano de 2020 ficará na memória como o ano da covid-19. Porém, além disso, ele também lembrado como o ano dos estímulos sem precedentes; estímulos fiscais, creditícios, monetários e tudo o que governos têm direito sendo marca das respostas para conter os efeitos da pandemia na economia ao redor do mundo.
Como podemos ver no gráfico abaixo, o Brasil não foi exceção. Programas que incluíram o auxílio emergencial para informais, o benefício de prestação continuada (BPM) para trabalhadores formais, além de pacotes de crédito garantidos pelo Tesouro Nacional a micro, pequenas e médias empresas, e transferências para estados e municípios somarão mais de 8% do PIB em impulso fiscal ao final de 2020.
Se você, como bom(a) portador(a) da síndrome do vira lata do brasileiro, está se perguntando se toda essa gastança foi eficaz, a resposta é “sim”.
De fato, ainda veremos muitos debates sobre se deveríamos ter gastado menos, mas a realidade é que os programas foram majoritariamente bem-sucedidos ao que se propuseram: mitigar os efeitos nefastos de medidas de isolamento social (necessárias) na atividade econômica.
Os dados não mentem, e números do terceiro trimestre deste ano já indicam uma recuperação mais robusta do que o imaginado no início desta crise, principalmente nos setores industrial e do varejo, puxados principalmente por tais programas de estímulos. Nossa expectativa é que o PIB brasileiro contraia 4,6% no ano nesse ano (frente projeção de -6% em maio).
Diante disso, por que o mercado tem reagido negativamente quando falamos de extensão de programas de estímulo no Brasil, com abertura da curva de juros e queda no Ibovespa, enquanto Wall Street não vê a hora para que um novo pacote seja aprovado nos EUA? Porque, como também diria minha mãe “quem faz a fama, deita na cama”, e tudo é uma questão de credibilidade.
Com um passado marcado por períodos alternados entre irresponsabilidade fiscal e inflação fora do controle, o Brasil havia apenas começado a dar os primeiros passos em direção à maturidade fiscal nos últimos anos. Aprovamos o regime do teto de gastos (que controla as despesas de acordo com a inflação do ano anterior), a reforma da previdência e a mudança da taxa de juros do BNDES — que deixou de representar mais um custo ao Tesouro Nacional, além de não mais prejudicar a eficácia da política monetária do Banco Central.
O movimento de controle de gastos foi fundamental para a redução dos juros para patamares historicamente baixos, criando um ciclo virtuoso para investimentos produtivos e financeiros, além de baratear nossa dívida. Para se ter uma ideia, a cada 1.p.p de aumenta na taxa Selic, o custo da dívida brasileira sobe em R$ 35 bilhões!
Foi também esse mesmo movimento que nos trouxe à essa crise com uma taxa de juros baixa, e inflação sob controle – fazendo com que o Banco Central pudesse seguir baixando a taxa Selic de modo a estimular a economia em um período de extrema contração da atividade.
Em linguagem de mães, essas medidas nos colocaram ali na fase de “permissão de ir à festa, com todo mundo, com algumas condições”.
Porém, assim como aparecer em casa 3 horas depois do combinado nos tiraria os privilégios de ir para a festa “como todo mundo”, extrapolar os gastos que elevarão nossa dívida/PIB em aproximadamente 20p.p. nesse ano para o período pós pandemia (comparado a uma média de 10 p.p. em países emergentes, onde a dívida já se encontrava em patamares muito menores do que a nossa antes da crise) certamente tiraria do Brasil “privilégios” como o financiamento a taxas historicamente baixas, e inflação ancorada também em níveis historicamente baixos.
Por fim, resta ao Brasil apenas a pergunta: será que vale a pena cutucar a mãe (ops, onça) com vara curta? Minha experiência me diz que o mais prudente é perder o finzinho… Afinal, ninguém gosta de ficar conhecido como arroz de festa, não é mesmo?
Resumo do dia: “Quase lá”
(por Paula Zogbi)
Mercados mundiais amanhecem em alta nesta sexta-feira. O Stoxx 600 sobe 0,8%, repercutindo bons resultados de empresas dos setores financeiro e automotivo. Nos EUA, futuros sobem 0,2%.
Ontem, a presidente da Câmara dos representantes dos EUA, Nancy Pelosi, disse estar “quase lá” nas negociações do novo pacote de estímulos com o secretário do Tesouro Steve Mnuchin. Mas discussão, que era para ter acabado na terça, ainda pode “levar um tempo”, segundo ela mesma.
Quem venceu o debate? Com tom mais ameno, o debate entre Joe Biden e Donald Trump que foi ao ar na noite de ontem repercute nesta manhã com falas do candidato democrata contrárias à indústria petroleira. O presidente atual, por sua vez, disse que o oponente e seu filho têm envolvimento irregular com China, Ucrânia e Rússia. Não foram apresentadas novas narrativas com potencial de alterar a liderança na disputa.
No Brasil, os bancos deram o ar da graça ontem, subindo em torno de 5% e, junto à Petrobras, ajudando o Ibovespa a fechar com alta de 1,36% a 101.917 pontos, maior patamar de fechamento desde 1º de setembro.
Com negociações liberadas para o varejo, BDRs tiveram variações consideráveis na B3, com alta de 13% para a GAP e 11,68% para a Macy’s em destaque. A queda mais acentuada foi registrada pela Chipotle (-5,13%). Os certificados de ações estrangeiras tiveram 31,5 mil negócios no dia, quase 30 vezes a média diária de 1.060 em 2020. Confira os destaques, conforme levantamento da Economática:
Agenda da Semana |
Sexta-feira, 23 04h15: França – PMI Serviços out. (ant: 47,5) 04h30: Alemanha – PMI Serviços Markit out. (exp: 49,5; ant: 50,6) 05h00: Zona do Euro – PMI Serviços Markit out. (exp: 47,5; ant: 48) 08h00: Brasil – FGV Confiança do Consumidor out (ant: 83,4) 09h00: Brasil – IPCA-15 (a.m.) out (exp BBG: 0,7%; exp XP: 0,9%; ant: 0,5%) 09h00: Brasil IPCA-15 (a.a.) out (exp BBG: 3,3%; exp XP: 3,51%; ant: 2,7%) |